Brasília sonora
Artistas de diferentes ritmos projetam capital federal para o restante do Brasil
Babel cultural, caldeirão de ritmos e celeiro de músicos são algumas das denominações com as quais Brasília tem sido contemplada. Embora com apenas 57 anos de existência, esta, que é uma das mais modernas capitais do mundo, se distingue artisticamente, a ponto de — em alguns casos — ser vista como referência nacional e até internacional.
Ponto de convergência de brasileiros e estrangeiros, a cidade, ao longo das últimas cinco décadas, absorveu antropofagicamente a rica contribuição desses “novos brasilienses”. Certamente, é na música em que isso mais se manifesta. Com o passar do tempo, Brasília transformou-se também num polo de exportação. É extensa a lista de compositores, cantores, bandas e instrumentistas candangos que levaram a música brasiliense a ter reconhecimento no Brasil e no exterior. Após incursionar por rico universo de gêneros, o Correio apresenta aqui um diversificado painel, ao colocar em evidência nomes que alcançaram esse patamar.
Rosa Passos (MPB)
Artistas como Oswaldo Montenegro, Cássia Eller e Zélia Duncan são ilustres representantes do segmento MPB, cujas vozes ecoaram com vigor fora do Distrito Federal. Rosa Passos foi mais além. Com 35 anos de carreira e 17 discos lançados, a cantora e compositora baiana-brasiliense se fez ouvir em vários continentes. Ela já se apresentou no Japão, em vários países da Europa e das Américas do Norte, do Sul e Central. “Embora nascida em Salvador, me considero uma baiana-brasiliense, até porque moro na capital desde meados da década de 1970, e foi aqui onde minha carreira decolou.”
Renata Jambeiro (Samba)
Cantora brasiliense com uma trajetória de 20 anos, que acumula três álbuns, um DVD e um documentário, Renata Jambeiro tem mostrado no Brasil e no exterior que a cidade tem samba no pé. Depois de morar por cinco anos no Rio de Janeiro, onde tornou sua voz bem conhecida, ela está radicada em São Paulo há oito meses. Lá, produz atualmente uma série para a internet, sob o título Mulheres do samba, em que o foco principal é o empoderamento das mulheres ligadas ao segmento. “Sou um reflexo de Brasília, cidade multicultural, que me fez valorizar ainda mais nossas raízes musicais.” Dhi Ribeiro, Marcelo Sena, Breno Alves, Amilcar Paré e Cris Pereira são outros sambistas que já levaram sua arte para além dos limites do DF.
Hamilton de Holanda (Choro)
Possivelmente, o instrumentista brasileiro de maior projeção internacional de uns tempos para cá, Hamilton vive em constante ponte aérea entre o Rio de Janeiro (cidade onde mora desde 2003) e a Europa. Autor da peça clássica Sinfonia Monumental (com Daniel Santiago), composta para as comemorações dos 50 anos de Brasília, detentor de vários prêmios — inclusive um Grammy Latino — ele é muito requisitado também para apresentações nos Estados Unidos, e já esteve na África, Oceania, América do Sul e América Central. Odette Ernest Dias, Reco do Bandolim (e o grupo Choro Livre), Fernando César, Dudu Maia, Victor Angeleas, Ian Couri e Tiago Tunes — músicos de diferentes gerações também internacionalizaram o choro brasileiro.
Paulo André Tavares (Jazz)
Músico há 40 anos, professor de algumas gerações de violonistas e guitarristas, Paulo André Tavares acompanhou Oswaldo Montenegro, Rosa Passos, Cássia Eller e Zélia Duncan no início da carreira deles. Formado em composição pela Universidade de Brasília (UnB), ex-mestre da Escola de Música e ex-integrante do grupo Corda Solta, ao lado de Jaime Ernest Dias e Tony Botelho; e com dois discos lançados, Paulo André exibiu seu talento também em Nova York, na época que fez mestrado em jazz no Queens College, no começo da década passada. “O ambiente musical de Brasília, com suas múltiplas nuances, sempre foi fonte de inspiração e aprendizado para mim”, afirma o músico, que cita Renato Vasconcellos, Oswaldo Amorim e Pedro Martins como expoentes do jazz na capital.
Alexandre Carlo (Reggae)
O nome de maior destaque do reggae brasiliense no país, Alexandre Carlo, há duas décadas, criou a Natiruts (originalmente Nativus) e fez dela uma das mais importantes bandas brasileiras do gênero. Com seis discos de estúdio, cinco gravados ao vivo e quatro DVDs, tem fãs espalhados por todo o país, inclusive gente famosa, como Ivete Sangalo, que participou do DVD Reggae Brasil, gravado em 2015 na Praia do Forte, Bahia. Dois anos antes, havia conquistado o Grammy Latino, na categoria Melhor Álbum Pop Contemporâneo. Admirador do trabalho do veterano regueiro Renato Matos — outra referência desse segmento em Brasília – Alexandre destaca: “O lado místico e as belezas naturais do Cerrado sempre serão os pilares fundamentais da minha arte.”
Nivaldo do Acordeon (Ritmos nordestinos)
Há 38 anos na capital, o piauiense Nivaldo do Acordeon já fez parte dos trios Asa Branca e Siridó. Em carreira solo desde 2009, contabiliza 12 discos lançados. Há algum tempo, ele tem se dividido entre Brasília e São Paulo, onde faz show em casas de forró, dá aulas de acordeon, além de trabalhar com Anastácia, a mítica forrozeira nordestina, ex-mulher do saudoso Dominguinhos. Nivaldo tem como discípulo o filho Vavá Gomes, líder do Trio Balançado. “Como músico, devo tudo a Brasília. É onde fiz meu nome como sanfoneiro, tendo, inclusive, o reconhecimento de artistas e do público de outras cidades brasileiras”, festeja.
X (Hip-hop)
Ceilândia, reduto do rap em Brasília, tem alguns dos principais nomes do Brasil. Um deles é X, ex-líder do premiado Câmbio Negro, que deixou marca na cena brasiliense, e levou sua música de protesto a São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba e Recife, além de outras cidades. Partícipe do trabalho de outros companheiros de luta afirma: “Brasília marcou minha trajetória por ser a capital do poder; ou torre do poder, como relatei no encontro que tive com Chico Science, o criador do mangue beat”. Gog, Japão, Jamaica, Flora Matos e Froid (ex-Um Barril de Rap) são outras referências do hip-hop brasiliense.
Roberto Corrêa (Música caipira)
Morador da capital desde 1975, foi aqui que Roberto Corrêa, mineiro de Campo Verde, iniciou a trajetória como compositor e violeiro. Ícone da música caipira no país, ele tem levado ao exterior esse gênero — que representa a autêntica cultura popular do sertão — a lugares inimagináveis, entre os quais China, Japão, Alemanha, Itália e países africanos. Cidadão honorário de Brasília, foi condecorado com a Ordem do Mérito Cultural. “Essa cidade, tão cosmopolita, que me acolheu de forma carinhosa, permitiu que eu desenvolvesse a arte de pontear a viola e, de alguma forma, foi responsável por me fazer conhecido nacionalmente e no exterior”, ressalta. Para Corrêa, Badia Medeiros, Cacai Nunes e Zé Mulato & Cassiano são cantadores e violeiros com trabalhos relevantes, apreciados em outras regiões.