Aniversário de Brasília - Banner
CULTURA

Ao som dos garotos de Liverpool: no Lago Sul, vizinhos se reúnem para conversar sobre os Beatles

Moradores do Lago Sul, Eduardo Levy e José Alexandre gostam de se encontrar para beber um bom vinho e conversar sobre as canções dos Beatles. Cada um tem as suas preferidas

Pedro Almeida*

Arquivo pessoal
Com os bonecos de cera dos Beatles, em Londres | Foto: Arquivo pessoal

Já se vão 52 anos desde que os Beatles oficializaram o fim da carreira. Em 1970, John, Paul, Ringo e George colocaram um ponto final em um dos projetos musicais mais importantes do século 20. O legado, porém, se perpetua até hoje. As canções compostas nos anos 1960 em Liverpool, na Inglaterra, extrapolaram as fronteiras do espaço e do tempo e chegaram até o Lago Sul, em 2022. O quarteto é motivo de encontro para debates regados a vinho entre os vizinhos Eduardo Levy e José Alexandre, que compartilham da paixão e de uma coleção invejável de artigos sobre a banda.

O carioca Eduardo, que é mais conhecido como Levy, rememora a infância no Rio de Janeiro. Em uma descrição que pinta uma cidade que já não existe mais, ele conta sobre os papos no paredão da Urca e as descobertas musicais. Nos anos 1960, ainda no colégio, Levy descobriu a Modern Sound, uma loja de discos situada na rua Barata Ribeiro, coração de Copacabana. O estabelecimento, que se tornaria um marco cultural da cidade, trazia uma coleção de discos atuais do mercado internacional. Eduardo teve, enfim, a oportunidade de conhecer um tal quarteto que fazia um certo barulho mundo afora. Para praticar um pouco do inglês, ele levou para casa uma “bolacha” dos Beatles e nunca mais foi o mesmo. Hoje, aos 70 anos, ele trocou de capital, mas a idolatria permanece.

José Alexandre não sabe precisar quando, nem por que o amor pelos Beatles se deu. Talvez, a mãe, que tinha uma conexão com a música, pudesse tê-lo introduzido; ou, porventura, o aprendizado do piano tenha sido a chave, já que, ainda que primorosas, as canções do grupo podem ser tocadas com relativa facilidade. José lembra-se, inclusive, de ter, na adolescência, um cachorro chamado John Paul, em homenagem aos vocalistas da banda. Se o início do amor não pode ser pinado, tampouco o fim. Aos 49 anos, o advogado capixaba, que se considera brasiliense, segue aficionado pelo quarteto de Liverpool e faz questão de compartilhar o interesse com os três filhos, que também são fãs da banda.

A quadra 26 do Lago Sul, na qual os beatlemaníacos residem, conta com uma associação de moradores, cuja presidente é esposa de José Alexandre. Em uma das reuniões, sediada no lar do casal, Levy compareceu e notou a vasta coleção de José Alexandre sobre a banda. Nascia, ali, a amizade pautada pelo interesse comum. Dali em diante, a dupla se encontraria incontáveis vezes sem o pretexto da associação de moradores. Para não dizer que os encontros são estritamente monotemáticos, ambos são categóricos ao afirmarem que há um outro assunto importante: o Flamengo. “Mas os papos inteligentes são sobre Beatles”, brinca José Alexandre.

Arquivo pessoal
Eduardo Levy ao atravessar a faixa de pedestre da Abbey Road | Foto: Arquivo pessoal

Quebra-cabeças

Os mais de 20 anos que os separam fazem com que a discussão não se esvazie. Questões geracionais, além dos gostos pessoais, entram em jogo e trazem visões distintas sobre cada uma das peças do vasto quebra-cabeças que é a obra completa dos Beatles. Se José Alexandre aponta Blackbird como a grande canção, Abbey Road como o melhor álbum e George Harrison como o Beatle preferido, Levy enaltece Yesterday, prefere o Álbum Branco e condecora Paul McCartney como o melhor do quarteto.

Além do extenso catálogo, a banda, para a sorte do duo, gera frutos mesmo após meio século de rompimento. Livros, filmes e documentários novos com materiais inéditos estão sempre à disposição todos os anos. As vozes de José e Levy também já se misturaram à da legião de fãs nos shows de Paul McCartney, ativo até os dias de hoje em carreira solo. Para cada novidade, ou no simples prazer de reavivar um disco antigo, basta abrir o vinho, acionar o vizinho e deixar o som rolar.

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira