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MEMÓRIA

Donos das pizzas Dom Bosco e Albert’s são amigos desde os anos 1960

Os dois empreendimentos estão localizados na rua comercial da 107/108 Sul desde os anos 1960, quando Enildo Veríssimo e José Juarez Santana se conheceram

Arthur de Souza

 Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
Enildo (E) e José Juarez: uma amizade sólida que superou crises econômicas

Alguém poderia imaginar que, de uma rivalidade entre os dois times considerados os maiores de Minas Gerais, fosse surgir uma amizade que dura mais de 50 anos? Pois é justamente o que acontece com Enildo Veríssimo Gomes, 76 anos, um dos atuais donos da Pizzas Dom Bosco; e José Juarez Santana Neves, 82, proprietário da Albert’s, uma loja de vestuário.

Os dois empreendimentos estão localizados na rua comercial da 107/108 Sul desde os anos 1960 e, de acordo com Juarez, o primeiro contato entre os dois aconteceu quando ele foi até a pizzaria. “Ele sempre foi muito brincalhão e, nesse dia, (o Enildo) estava falando sobre futebol — eu sou torcedor do Atlético-MG e ele, do Cruzeiro. A partir daí, se consolidou essa relação que dura até hoje”, lembra. O dono da loja de vestuários brinca com a situação que ocorreu na época, dizendo que “juntou uma sopa de galo com uma de raposa”. Entre risadas dos dois amigos, Enildo não perde tempo e, atestando o adjetivo dado pelo vizinho de comércio, alfineta José. “Mesmo na situação atual, o Cruzeiro continua sendo o maior de Minas”, comenta.

Teimosos

Sobre o longo período da relação, os amigos comentam que a aproximação foi um dos fatores essenciais para que ambos ‘sobrevivessem’ com seus comércios. “Com todas as crises que o país passou durante esses anos, muita gente fechou ou abandonou o negócio, mas eu e o Juarez somos teimosos e, mesmo que devagarinho, continuamos”, frisa Enildo. “E a amizade ajudou bastante nisso. Um sempre favorece o outro, seja trocando ideias — apesar de sermos de ramos diferentes —, dando dicas, etc.”, aponta.

O dono da Dom Bosco também lembra que, durante algumas das crises — inclusive na época da ditadura — enquanto todo mundo reclamava, ele e o amigo continuavam focados no nosso trabalho. “Sempre se ajudando. E naquele tempo, ainda tinham mais pessoas, donos de outros comércios, que também colaboraram. Hoje em dia, somos os sobreviventes”, complementa Enildo.

Além da questão comercial, eles brincam com o fato de serem os dois que — da época em que os estabelecimentos foram abertos — ainda estão vivos. “Quase todos já ‘foram embora’, mas ainda estamos persistindo. Os dois teimosos que ainda não foram escalados lá para cima”, diz Juarez. “E vamos continuar essa amizade enquanto Deus permitir que a gente esteja aqui. Só que a nossa intenção é bater o pé e ficar por mais algum tempo”, garante Enildo.

Os empresários também pregam que, além da amizade entre eles, as famílias também se uniram, com um levando parentes para serem clientes da loja do outro. “Eu comecei a levar o meu filho para comer a pizza lá. De lá para cá, ele também passou a levar meu neto e assim vai indo. Tenho a honra de ser amigo e frequentar o estabelecimento dele durante todo esse tempo, com toda a minha família, e será desse jeito enquanto a loja durar”, promete Santana. “Com a minha família é a mesma coisa. Na hora de comprar uma roupa ou um presente qualquer, sempre é na loja do Juarez. Todos compram aqui”, destaca Enildo. Sobre a troca entre as famílias, Veríssimo lembra que o amigo tem decorado todas as medidas de cada um de seus entes. “Quando está chegando perto da data de algum aniversário, por exemplo, ele já sabe até qual é o tamanho da roupa”, atesta.

Brincadeira

Nessa longa história de amizade entre os comerciantes, eles acumularam muitas situações em que um acabou pregando peças no outro. Com medo de que Enildo fosse se chatear, José Juarez teve receio de recordar um dos fatos mais marcantes e hilários, que ocorreu há cerca de 15 anos. Contudo, o dono da pizzaria o relata com muitas risadas. “Ele estava de férias e a loja, por consequência, fechada. Só que eu resolvi fazer uma brincadeira e dizer para os clientes que apareciam que ele tinha quebrado e desistido do negócio”, conta Enildo. “Quando ele voltou, todo mundo ficou perguntando o que tinha acontecido”, comenta. “Ele fez isso mesmo, falou que eu tinha ido embora e não ia mais voltar”, lembra o dono da loja de roupas. “Quando abri de novo, o pessoal chegava dizendo: ‘Ainda bem que o senhor voltou, seu Juarez’. Aí eu perguntei ‘Voltei de onde? Só estava de férias’. Ele gosta de fazer esse tipo de brincadeira”, destaca.

Enildo afirma que existem outras histórias como essa, mas lamenta que sejam somente com quem é vizinho de longa data. “Essa proximidade entre comércios vizinhos já se tornou coisa rara. Tem gente que fica com uma rivalidade boba e nem conversa com o dono da loja que está do lado. Acho que isso acontece por serem gerações diferentes. Nós somos do tempo em que todo mundo conversava e tinha uma amizade legal”, observa. “Na época que nos conhecemos, todo mundo era muito humano, muito unido. Era normal você ver pessoas que chegavam em um restaurante, comia e voltava para pagar só no outro dia. Eu mesmo já tive um caderninho que anotava os famosos fiados”, completa Juarez.